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Informe 28/04/2020 19:07

Alterações no Direito Imobiliário brasileiro em decorrência do Covid-19

Confira algumas regras e alterações decorrentes deste novo panorama jurídico, que afetam diretamente o setor imobiliário do país, em especial para os proprietários e inquilinos

Por: Administrador

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É sabido que os impactos de isolamento social imposto pelas autoridades públicas, na tentativa de conter a propagação do Coronavírus, foram imediatamente sentidos pelo mercado imobiliário, afetando consideravelmente as receitas de construtoras, incorporadoras, empreiteiras, prestadores de serviços, terceirizados, shopping centers, lojas, espaços destinados ao coworking, fazendo surgir impasses e litígios na locação de imóveis comerciais e residenciais, gerando preocupação inclusive quanto à manutenção das atividades da construção civil.

Dessa forma, importante citarmos algumas regras e até alterações decorrentes deste novo panorama jurídico, que afetam diretamente o setor imobiliário do país, em especial para os proprietários e inquilinos, senão vejamos logo abaixo:

1. Contrato de locação residencial / comercial:

Como regra geral, o contrato foi feito para ser cumprido (pacta sunt servanda), devendo ser examinado com muita cautela a situação no caso a caso, a fim de verificar a real necessidade e a possibilidade do pedido de renegociação extrajudicial – e em último caso, a revisão ou extinção contratual, dado o impacto da pandemia para cada relação específica, eis que existem pessoas ou setor comerciais mais afetados pela crise do que outros segmentos.

Com relação aos contratos de locação de imóvel urbano, é importante repisar, nenhum contrato se encontra suspenso, ou seja, o pacto permanece válido e deixar de ser cumprido (não pagar) sem prévia negociação formalizada entre as partes haverá a incidência de todos os encargos, multa, juros, correção monetária e até mesmo situações extremas de despejo.

Destaca-se também que o perfil do locador imobiliário brasileiro não é uniforme, podendo ser sociedades patrimoniais, potencialmente mais resistentes à falta de pagamento, mas podem ser também pessoas que fizeram da aquisição de imóvel um meio de poupança, incluindo idosos que têm na locação sua garantia de subsistência, como renda extra para custear suas despesas diárias. Ou seja, muitos locadores necessitam do valor do aluguel para sobreviver, e esse dado é relevante para ser mensurado no cenário atual.

Assim, com relação à locação residencial, a recomendação é que haja uma negociação entre locador e locatário para tentativa de alteração do valor do aluguel, seja por meio de redução, parcelamento, descontos progressivos ou outra forma mais adequada às partes, para que o contrato seja cumprido na sua íntegra. Entretanto, cada situação deverá ser analisada para verificar se realmente houve alguma alteração na situação particular do locatário, por exemplo, redução de salário, de rendas ou desemprego, porque não cabe uma negociação pelo fato da ocorrência de pandemia, sem ter o locatário sofrido impacto negativo e sem comprovar uma diminuição na sua renda.

Por  outro lado, em relação à locação comercial, as lojas situadas em shoppings centers ou lojas situadas no comércio da cidade, por exemplo, também deverá ser ponderada a situação econômica de cada caso concreto, isto é, se a pandemia refletiu diretamente na economia do próprio negócio por meio de interrupção das atividades de venda ou por conta da redução do fluxo de caixa. Sabemos que em muitas cidades o comércio e shoppings foram ou continuam fechados, por decretos estaduais ou municipais, e isso certamente é importante para fins de renegociação de valores de aluguel com os proprietários de tais imóveis. 

E o que se pode fazer em caso da diminuição de faturamento ou interrupção das atividades comerciais? Como devemos agir? Primeiro, como já dito, é tentar uma negociação do valor do contrato com o locador ou o parcelamento dos alugueres durante o período de pandemia, sem a cobrança de juros/multa. O acordo entre as partes é a melhor forma de resolver essa situação conflitante, tanto para o locatário quanto ao locador, evitando a inadimplência e conservando o contrato firmado entre as partes, afinal, o objetivo maior do contrato é que a avença firmada seja realmente cumprida pelas duas partes envolvidas. A negociação deve envolver o bom sendo, razoabilidade, proporcionalidade, empatia e boa-fé das partes, para que haja um alinhamento de ideias e objetivos, visando recompor o justo equilíbrio na relação contratual.

Caso não haja negociação ou acordo entre as partes, existe a possibilidade do proprietário (locador) postular a revisão do valor do contrato pela via judicial, com fulcro nos artigos 317 e 567 do Código Civil, além do art. 19 da Lei de Locações (8.245/91), na qual o juiz corrigirá a prestação mensal, sendo que o locatário terá de comprovar a alteração da base objetiva do contrato, em razão da circunstância excepcional do momento de sua celebração para o de execução, consistente no pagamento das prestações. Por exemplo, a queda abrupta dos rendimentos da pessoa jurídica (locatária), tornando a prestação do aluguel no valor original excessivamente prejudicial à saúde financeira e econômica, com risco de levá-la à quebra. Tal prova fática será determinando para a melhor solução do caso na esfera judicial.

Portanto, a orientação para a solução dos contratos de locação de imóvel urbano é, preferencialmente, seguir pelo caminho negocial com intermediações entre locatário e proprietário (ou imobiliária), estabelecendo-se por um meio formal através de notificação extrajudicial ou e-mail, pautando-se sempre pelo espírito de parceria e boa-fé entre as partes, a fim de manter o contrato e evitar a inadimplência ou então a rescisão contratual.

2. Condomínio Edilício

É importante que os condôminos de um condomínio edilício tenham ciência de que a sua contribuição mensal por meio de pagamento de cotas condominiais é destinada ao pagamento das contas essenciais para sobrevivência do local / condomínio, especialmente para pagamento das contas de consumo (água, luz, limpeza, gás, etc.) e salários dos funcionários e colaboradores.

Em que pese a grave crise sanitária vivenciada no momento, o condômino não está desobrigado a suprimir a sua contribuição perante o condomínio, podendo responder pela inadimplência, de acordo com a previsão da Convenção do Condomínio, tudo conforme previsão do art. 12 da Lei nº 4.591/64, e art. 1.336, inciso I, do Código Civil, sendo dever do síndico e gestor condominial cumprir e fazer cumprir a convenção condominial, nos termos do art. 1.348 do Código Civil, sob pena de responsabilização pela omissão de não promover a cobrança dos inadimplentes.

É importante que os gestores condominiais e síndicos, prevendo o aumento de inadimplência dos moradores, iniciem cortes de despesas consideradas não urgentes e convoquem os prestadores de serviços para renegociação dos contratos, ao menos neste momento de pandemia. Com a redução das despesas, o condomínio pode aumentar o seu fluxo de caixa para suportar eventuais inadimplências de condôminos por determinado prazo, e neste sentido ajudar o condomínio a superar essa fase crítica.

Por fim, não se recomenda aos síndicos e gestores a negociação de descontos/isenções dos pagamentos de cotas condominiais, podendo deixar o condomínio sem receita para fazer frente às despesas mensais indispensáveis ao condomínio. Entretanto, deve haver o bom senso, avaliar-se caso a caso, flexibilizando, por exemplo, um parcelamento de débito, objetivando atender àquele condômino que realmente não tem recursos para pagamento imediato da parcela condominial. Isso deverá ser avaliado pelo síndico, não podendo ser a regra geral para todas as unidades habitacionais do local. 

3. Construção civil e incorporação imobiliária

Os setores da construção civil e da incorporação imobiliária também não estão imunes aos efeitos maléficos da crise que assola o país com a propagação da Covid-19, seja por paralisação de obras, redução de funcionários nas obras, perda de fôlego nas vendas de imóveis, rescisões de contratos de compra e venda, dificuldade de contratação de mão de obra ou fornecedores, etc.

Assim, estamos presenciando a paralisação de diversas obras, a indisponibilidade de mão de obra e de insumos para a construção, restrições à circulação de pessoas e exercício de atividades empresariais que implicam na impossibilidade de manutenção de contratos com fornecedores e empreiteiros, muitos em fase execução, possuindo inúmeros compromissos assumidos com empregados e outros fornecedores, o que cria uma reação em cadeia (círculo vicioso), podendo terminar com a paralisação total ou quase total das construções e incorporações em andamento no país, e impactando na capacidade de cumprirem os prazos de execução e de entrega prometidos no momento da venda. 

Por outro lado, os consumidores também sofrerão os impactos econômicos da crise, limitando a sua capacidade de honrar com as prestações financeiras mensais, assumidas nos compromissos de compra e venda, acarretando um aumento da inadimplência, pedidos de desligamento da relação contratual, atrasos na escrituração e na transferência da titularidade proprietária dos imóveis, revisões ou rescisões contratuais, etc.

Como é sabido o processo burocrático de uma incorporação imobiliária é intenso, sujeito a fiscalização do Poder Público, obtenção de licenças, de alvarás e de registro cartorários dos atos jurídicos, sendo que todas as atividades estão diretamente impactadas pela Covid-19, sem falar da própria execução das construções, com redução ou paralisação total das obras, a depender dos decretos estaduais ou municipais de cada localidade.

Logo, a pandemia e a crise atual vão interferir diretamente no calendário de obras, o que acarretará no atraso dos cronogramas.

Destaca-se que, na maioria dos contratos de compra e venda de imóvel na planta, há a cláusula de tolerância de 180 dias para entrega dos imóveis, mas, cabe a pergunta: será que o prazo da pandemia poderá ser acrescido para alargar esse prazo? embora não tenhamos a resposta, salientamos que isso dependerá de cada caso concreto e do entendimento do Poder Judiciário. Mas o que se sabe é que as construtoras deverão demonstrar que o excesso de atraso para além do prazo contratual de carência se deu exclusivamente pelos efeitos da pandemia do coronavírus, senão certamente irão responder pelas consequências da mora.

Neste sentido, o conselho às construtoras é que tomem redobrada atenção de um bom diário de obras, inserindo todas as informações possíveis, tais como: paralisação de obras (juntada de leis e/ou decretos publicados na cidade ou estado), ausência/redução de funcionários, falta/redução de material ou insumos, não comparecimento de fornecedores, atraso de obtenção de licenças ou “habite-se” ou alvarás, dentre outros motivos, que possam justificar e comprovar eventual atraso no andamento ou entrega das obras.

Além do mais, as construtoras devem mostrar sua proatividade durante esse período de pandemia e observar o dever de informação, isto é, notificando os seus clientes/consumidores de que as consequências da Covid-19, se for o caso, irão impactar no prazo de conclusão da obra para além da cláusula de tolerância, gerando atrasos nas entregas, podendo afastar a multa por atraso de entrega, a reparação de lucros cessantes e de danos morais.

Agora se determinado adquirente de imóvel na planta, por exemplo, que foi impactado pelo excessivo atraso na entrega do imóvel e tenha perdido o interesse no negócio. O que fazer? Primeiramente, recorre-se à boa-fé, ao diálogo e a renegociação extrajudicial, porque as soluções alternativas devem ser encontradas pelos próprios contratantes para preservar os contratos, a fim de evitar o Poder Judiciário até porque está funcionando restritamente para casos urgentes. Frisa-se que a revisão ou extinção judicial de contratos são remédios extremos que devem ser aplicados em último caso, eis que normalmente trazem fortes traumas para uma das partes.

Para a manutenção dos compromissos de compra e venda de imóveis nas incorporações recém-iniciadas, ou que estão por iniciar, ou de alguma forma irão sofrer os impactos da pandemia, o melhor caminho, como já dito, é o diálogo, tanto por parte da construtora, informando as medidas que serão adotadas e os possíveis impactos previsíveis, como também é dever do consumidor informar a alteração de sua situação financeira pessoal, procurando a adaptação de cláusulas contratuais, de modo a acomodar pretensões e expectativas na busca de preservação dos negócios imobiliários em curso.

4. Financiamento Habitacional (medidas para consumidor e construtora)

Por fim, devemos salientar uma boa notícia: recentemente, a CEF anunciou algumas medidas para flexibilizar os pagamentos de financiamentos habitacionais e fomentar a aquisição de novos imóveis, tais regras já passam a viger desde o dia 13/04/2020. Vejamos as regras:

4.1. Medidas adotadas para as pessoas físicas: (i) suspensão por 3 meses das parcelas de financiamento imobiliário; e (ii) carência de 6 meses para quem adquiriu imóvel, para solicitação dos benefícios, os clientes da CEF devem solicitar pelo aplicativa ou 0800. 

4.2. Medidas adotadas para as empresas: (i) antecipação de até 20% do financiamento em novos empreendimentos; (ii) liberação de recursos de financiamento não utilizados anteriormente; (iii) antecipação do financiamento da pessoa jurídica em valor equivalente a até 3 meses do cronograma de obra a executar; e (iv) carência de 180 dias para início das obras e iniciar amortização da dívida de obras concluídas.

 

 Fabrício Cagol

Diretor de Assuntos Jurídicos da ACP

 

Se tiver qualquer dúvida sobre o conteúdo abaixo, fale conosco através do e-mail contato@acpelotas.com.br.

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